Introdução
Os cristãos reconhecem na Bíblia como única regra de fé e prática. Esse status deve-se à compreensão de que ela foi inspirada, revelada e preservada pelo próprio Deus.
Nas Escrituras Sagradas, encontramos quatro evangelhos que registram a vida terrena de Jesus Cristo, seu nascimento, vida, morte e ressurreição. Esses evangelhos constituem-se em quatro percepções do Evangelho de Jesus Cristo.
Os três primeiros evangelhos são chamados sinóticos em virtude da semelhança que apresentam entre si, e no estudo do Novo Testamento essa matéria é tratada como “O Problema Sinótico”. O nosso foco neste artigo é o Evangelho de Jesus Cristo Segundo Lucas que conforme atesta Carson “é o livro mais longo do Novo Testamento e inclui boa quantidade de informações não encontradas em outros textos.”1. Sem mencionar a beleza e o estilo refinado do autor.
Data, Local e Autor do Evangelho
Datar uma obra antiga é sempre um desafio, e no caso do Evangelho de Jesus Cristo Segundo Lucas, temos os relatos da História da Igreja, que registra o testemunho cristão ao longo dos séculos. “Os períodos considerados possíveis como data do evangelho de Lucas são: 1) 59-63 d.C. e 2) as décadas de 70 ou de 80”2 Essa variação quanto à data deve-se as diferentes percepções do problema sinótico, que contemplam as relações entre este evangelho e os demais sinóticos, especialmente o de Marcos.
Para exemplificar a relação entre Lucas-Marcos, apresentamos o quadro contido no livro Teologia do Novo Testamento3:
A. Novo Material
B. Material de Marcos
1. Lc 1,1-4, 30
2.
Lc 4,31-34 = Mc 1,21-29
3.Lc 5,1-11
4.
Lc 5,12-6, 19 = Mc 1,40-3,19
5. Lc 6,20-8,3
6.
Lc 8,4-9,50 = Mc 4,1-25; 3,31-35; 4,35-6,44; 8,27-9,40
7. Lc 9,51-18,14
8.
Lc 18, 15-43 = Mc 10,13-52
9. Lc 19,1-28
10.
Lc 19,29-38 = Mc 11,1-10
11.
Lc 19,45-22,13 = Mc 11,15-14,16
12. Lc 22,14-24
Entre os possíveis locais de composição menciona-se Roma, Acaia, Éfeso e Cesaréia. “Esse evangelho, com suas designações pormenorizadas de locais da Palestina, parecia ter em mente leitores não familiarizados com aquela terra. Antioquia, Acaia e Éfeso são destinações possíveis”4
O local de destino relaciona-se ao endereço de Teófilo que não é explicitado.
Se considerarmos apenas as evidências internas, os Evangelhos, inclusive o terceiro, são anônimos. Isto é, não trazem indicação de autoria. Mas, o testemunho cristão primitivo associa esse evangelho a Lucas, bem como o livro de Atos, igualmente endereçado a Teófilo.
Abordando a autoria, Carson registra o testemunho do herege Marcião, perto do fim do século II, que embora não seja referência doutrinária, nada desabona o seu testemunho quanto à datação da obra. Outros testemunhos como o do Cânon Muratoriano, de . Irineu e Tertuliano que dão como certa a autoria lucana do terceiro evangelho5
Cullmann chama a atenção para a apresentação que aponta para uma pessoa metódica que criteriosamente organizou sua obra, fazendo uso de termos clássicos ao contrário dos barbarismos e neologismos dos outros evangelistas6.
Enfoques...
O Dr. John Barry Dyer ao apresentar o tema do trimestre na Revista Atitude7 do segundo trimestre de 2007 apresenta as ênfases do Evangelho Segundo Lucas, assim distribuídas: Jesus, o perfeito ser humano; Jesus e o sofrimento humano; Jesus e os perdidos; Parábolas e milagres; Jesus, vitorioso sobre a morte; A exaltação de Jesus e o Espírito Santo.
O Dr. Dyer destaca a identificação de Jesus Cristo com o ser humano em toda a sua complexidade. Essa abordagem deve ser bem refletida, especialmente em um contexto cultural, como o brasileiro, em que para muitos a figura percebida como Jesus Cristo está desencarnada do dia a dia das pessoas, inclusive dos cristãos. Lucas apresenta-nos não apenas uma tema abstrato para reflexão, ou um Jesus para menções litúrgicas, mas um ser humano que com os humanos está identificado. Toda forma desumana, e desumanizadora de existir, é uma afronta a Jesus Cristo,e uma afronta ao Evangelho.
Outro enfoque que deve ser resgatado no estudo do terceiro evangelho é a ênfase missionária, e a preocupação de Deus com a raça humana. O Dr. Timóteo Carriker referindo-se aos livros de Lucas-Atos, assevera “a apresentação mais clara da missão universal da igreja em todo o Novo Testamento.”8
Carriker lembra que em Lucas, Jesus Cristo não é apresentado como um descendente de Abraão, mas como um descendente de Adão (Lucas 3.23-38), e logo irmão de todos os seres humanos. Outra contribuição relevante é a demonstração de que Jesus Cristo quebrou várias barreiras9.
Geográficas (4.31, 38, 42, 43, 44)
Sociais: fariseu (7.36; 11.37; 14.1), mulher pecadora (7.36-50), publicanos (5.27-32), coletor de impostos (19.1-10), pobres e oprimidos (4.18; 7.41-43; 11.5-8), ricos , mulheres.
Culturais e religiosas: samaritanos (10.29-37), leprosos (17.11-19), centurião romano (7.9),
A ênfase missionária está presente também no final do evangelho (24.48) onde os existe a afirmação do ser testemunha. Em sua obra Lucas expõe sua metodologia (1.1-4) ele utilizou três fontes: várias narrações compostas antes dele, informações colhidas junto a testemunhas oculares, e a tradição oral das pregações apostólicas.10 Todas essas fontes colaboraram para que o testemunho do Evangelho de Jesus Cristo atravessasse os séculos.
Desafios Para o Homem Moderno
O Evangelho Segundo Lucas apresenta vários desafios para a atualidade, entre eles mencionamos.
A utilização da inteligência dada por Deus. No primeiro capítulo Lucas afirma que existiam outros relatos, e que ele resolveu pesquisar e escrever um relato cuidadoso e em ordem para o Exmo. Teófilo. Nesses dias em que a mediocridade e o misticismo cego têm ocupado lugar na religiosidade evangélica, convém lembrar que Deus nos fez seres pensantes e que a nossa inteligência e racionalidade devem ser usadas inclusive na adoração.
A quebra de barreiras – Ao quebrar as barreiras Jesus desfez todas as distâncias existentes entre os segmentos sociais dos seus dias. Em uma sociedade cheia de preconceitos e discriminação, os cristão precisam agir fraternamente uns com os outros, e com o próximo, e também com os não batizados.
Que o Espírito Santo de Deus ilumine o nosso espírito par a que estudo do Evangelho de Jesus Cristo segundo Lucas, nos ajude a amadurecer e viver a cada dia a fé cristã. Amém!
* O Pr. Alfrêdo Oliveira Silva é natural de Feira de Santana – Bahia, casado com a Professora Lídia Souto de Moraes Oliveira Silva; e pai de Anália Moraes Oliveira. É Bacharel em Teologia (com concentração na área Pastoral-Missiológica – 1995), e Mestre em Teologia (com especialização na área Bíblica – Novo Testamento – 1999), pelo Seminário Teológico Batista do Norte do Brasil (STBNB). Atualmente mora em Recife-PE, onde leciona no STBNB e na Academia Memorial de Ensino Superior de Pernambuco (AMESPE), é membro da Coordenadoria de Desenvolvimento Cristão Convenção Batista de Pernambuco (CDCCBPE), e membro da Igreja Batista da Capunga em Recife-PE.
1CARSON, D. A.; MOO, D. J.; MORRIS, L. Introdução ao Novo Testamento. São Paulo: Vida Nova, 1997. p. 123
2Bíblia de Estudo NVI/ organizador geral Kenneth Barker; co-organizadores Donald Burdick... [et al.] São Paulo: Editora Vida, 2003 p. 1717
3 JEREMIAS, Joachim. Teologia do Novo Testamento: a pregação de Jesus. São Paulo: Paulinas, 1977. p. 68
4Bíblia de Estudo NVI Idem p. 1718
5 CARSON idem. p. 125
6CULLMANN, Oscar. A Formação do Novo Testamento. 6ª edição. São Leopoldo: Editora Sinodal, 1996. p.35
7Revista Atitude, Escola Bíblica Dominical, Ano XV – Abr. Mai. Jun. 2007, p. 5
8CARRIKER, Charles Timothy. Missão Integral. Uma Teologia Bíblica. São Paulo: Editora SEPAL, 1992. p. 201
9CARRIKER, C. Timóteo. Missões Na Bíblia. São Paulo: Vida Nova, 1992. p. 25ss
10CULLMANN, Oscar. idem p.34
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